Decisão segue recomendações de órgãos internacionais dizem especialistas
Um acórdão da 3ª turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) condenando uma franquia do McDonald’s da Capital a indenizar em R$ 30 mil um ex-gerente que engordou 30 quilos durante os 12 anos de trabalho na lanchonete repercutiu dentro e fora do país. No campo jurídico, juízes, professores e pesquisadores acreditam que a decisão do TRT reforça uma tendência adotada por magistrados em valorizar as relações de trabalho num sentido mais amplo.
Desde que o acórdão se tornou público, em meados de outubro, mobiliza o interesse internacional. Ontem, estava entre os quatro tópicos de maior interesse nos Estados Unidos (EUA) em sites como Google Notícias, em assuntos relacionados a Porto Alegre. Para a doutora em Direito das relações sociais, a juíza e professora do Departamento de Direito Econômico e do Trabalho da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Luciane Cardoso Barzotto, o acórdão contempla recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT). De acordo com os dois organismos, mais do que a ausência de doença, saúde é melhoria da qualidade de vida do trabalhador.
– A decisão do TRT, que traz à luz o direito à alimentação como um direito fundamental, torna a decisão muito atual e em sintonia com as recomendações tanto da OIT quanto da OMS.
Especialista diz que caso pode abrir precedentes
Para o professor de Direito do Trabalho na Universidade de São Paulo, o juiz Jorge Luiz Souto Maior, o acórdão sinaliza que o direito do trabalhador é mais do que uma mera “equação matemática”.
– A decisão representa um avanço porque visa a garantir o respeito à condição humana – sustenta Souto Maior, um dos principais especialistas do assunto no país.
Embora indenizações envolvendo sobrepeso nas relações de trabalho sejam incomuns, o acórdão da 3ª turma do TRT-RS segue a linha de mestres cervejeiros ou enólogos já indenizados por desenvolverem alcoolismo em função de suas atividades profissionais.
– Se o trabalhador era obrigado a ingerir uma alimentação gordurosa em função de sua atividade, que acarretava dano a sua saúde, é natural que ele seja indenizado – sustenta Gilberto Stürmer, professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Coordenador da pós-graduação de Direito do Trabalho da UFRGS, o professor Leandro do Amaral Dorneles de Dorneles acredita que o acórdão envolvendo uma das marcas mais conhecidas terá repercussões:
– Acho que vai abrir precedentes.
Saiba mais
ENTENDA O CASO
- Um acórdão da 3ª turma do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (TRT-RS), em outubro, decidiu que uma franquia do McDonald’s da Capital deve indenizar um ex-gerente de uma lanchonete pelo ganho de 30 quilos ao longo de 12 anos de trabalho na empresa. Conforme o advogado Vilson Natal Arruda Martins, entre as funções de seu cliente estava a degustação dos produtos vendidos no estabelecimento.
- Além da indenização, o TRT-RS determinou que a franquia auxilie o ex-funcionário a custear um tratamento médico visando à redução de peso.
- A decisão, que ratificou parcialmente uma sentença em primeira instância, não é definitiva porque permite recurso.
- Em nota, a empresa Kalloponi Comércio de Alimentos, franqueada da marca McDonald’s, informa que “está trabalhando para avaliar as medidas jurídicas em relação ao caso”. O texto diz também que a “rede oferece grande variedade de opções de alimentos e cardápios balanceados para atender às necessidades diárias de seus funcionários”.
Especialistas consultados por ZH dizem que o acórdão vai na linha de decisões já tomadas pela Justiça como:
- Mestres cervejeiros ou enólogos que desenvolvem alcoolismo em função da atividade profissional.
- Funcionários de estabelecimentos como bares e boates que contraem doenças respiratórias em decorrência de ambientes insalubres.
- "A decisão tem uma função pedagógica porque os empregadores são obrigados a zelar pela saúde dos trabalhadores. A partir deste acórdão, os empregadores desta área terão mais cautela em relação a alimentação dos seus empregados."
Dr. Lídia Coelho Herzberg
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