quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A revista abusiva feita pelo fornecedor

Alguns estabelecimentos comerciais, principalmente supermercados, adotam como regra a realização de uma revista após o pagamento do produto pelo consumidor. Tal fato ocorre na saída, onde um funcionário confere os produtos levados com os registrados na nota fiscal.
Tal procedimento, a nosso pensar, além de constrangedor, é um abuso, viola o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, art.1º, III, da Constituição Federal, e o Código de Defesa do Consumidor:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(…)
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
A revista é iníqua no sentido de ser injusta e é abusiva no sentido de ser inconveniente. Também é incompatível com a boa-fé, haja vista que ninguém sai de casa para ir a um supermercado com a expectativa de que após pagar pelo produto tenha que se submeter a uma revista ao sair do estabelecimento.
A abusividade decorre também da violação ao art.39, mesmo não previsto ali de forma expressa. Isto, porque esse rol é apenas exemplificativo e tal procedimento viola o sistema de proteção ao consumidor.
Para Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin:
“O administrador e o juiz têm, aqui, necessária e generosa ferramenta para combater práticas abusivas não expressamente listadas no art.39, mas que, não obstante tal, violem os padrões ético-constitucionais de convivência no mercado de consumo, ou, ainda, contrariem o próprio sistema difuso de normas legais e regulamentares, de proteção do consumidor.(CDC comentado pelos autores do anteprojeto, Forense Universitária, 2007, São Paulo, p.378).”
No Brasil, a transferência da propriedade do bem móvel dá-se pela tradição, ou seja, pela simples entrega do bem. Assim, quando o consumidor recebe o produto no caixa após realizar o pagamento, tem-se que o bem que antes pertencia ao supermercado passou a partir de então a pertencer ao consumidor.
Ao adotar como regra tal revista, o estabelecimento parte do pressuposto de que todo consumidor pode estar levando consigo um produto não pago e isso, por si só, já é uma afronta à dignidade da pessoa humana.
O fornecedor tem o direito de fiscalizar aqueles que frequentam o seu estabelecimento fazendo uso de câmeras, segurança, etc. Porém, fazer uso de revista após o pagamento do produto, a nosso pensar, constitui abuso do direito, além de violar a Constituição Federal e o Código de Defesa do Cosumidor.
O argumento de que só se submete à revista quem quer, é no mínimo pífio. Ninguém é abordado sob a informação de que a revista é voluntária, até porque se assim o for, dificilmente se deixará revistar. A prova disso é que não há tal informação em local visível e de fácil acesso. Em todo o caso, se a revista é “voluntária” e a abordagem omite esse fato do consumidor, tal conduta poderá ser tipificada como crime contra as relações de consumo(art.66 do CDC), por induzir o consumidor a erro, qual seja, submeter-se a uma revista sem saber que poderia recusar-se à mesma.
É importante que o consumidor tenha a consciência de que não pode ser obrigado a submeter-se a revista e, caso não o queira, manifeste de maneira inequívoca e incisiva a sua recusa ao ser abordado. Caso seja forçado ou constrangido a tal revista, denuncie o fato à delegacia de defesa do consumidor, ao Procon, e ao Ministério Público.
Na cidade de Natal, por exemplo, a lei municipal nº 5.957/09 proíbe os estabelecimentos comerciais de submeterem os consumidores à conferência das mercadorias após o pagamento e liberação nos caixas registradores.
Caso a espera por um entendimento final por parte da justiça sobre o assunto seja tormentosa, e/ou entenda ser trabalhoso denunciar tal fato aos órgãos de defesa do consumidor, poderá adotar uma medida mais simples: evitar esse tipo de fornecedor. Dar preferência ao estabelecimento que não lhe submeta a revista.
Agora que você já sabe, exerça o seu direito. Agindo assim, estará contribuindo para a melhoria da qualidade das relações de consumo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário